Tenho estado a reler o livro de José Andrade “Histórias do P.P.D.A.” e muito tenho recordado dos tempos fundacionais da Democracia nas nossas Ilhas, no período imediatamente a seguir à Revolução do 25 de Abril. Bastantes pormenores tinham-me passado da memória e agora tenho tido a possibilidade de os articular uns com os outros, num enriquecimento que, julgo eu, merece ser partilhado.
A questão da Autonomia surge logo em toda a sua amplitude nos primeiros textos apresentados pelo novo Partido, seguindo linhas que tinham aliás estado no debate público nos tempos anteriores. O problema financeiro das Juntas Gerais era crucial e a sua solução vinha a ser reclamada de muitas maneiras e por diferentes vozes. Mas para o então PPDA a proposta ia muito mais longe e incluía já a estruturação dos Açores como Região Autónoma. Assim aparece formulada no documento intitulado “Primeiro Esboço de Declaração de Princípios”, publicado no Correio dos Açores de 29 de Maio de 1974, por sinal subscrito , em nome da Comissão Organizadora, por Jorge Nascimento Cabral.
Nesse mesmo documento, apresentando-se como Partido para a Democracia, propunha o PPDA, entre outras coisas, “a integral garantia das liberdades cívicas”, “a eleição directa dos titulares dos cargos políticos e administrativos” e ainda “o fortalecimento do regime autonómico (eleição directa das juntas gerais, ampliação da sua composição, revisão do modo de funcionamento, revitalização financeira)”.
Pouco tempo depois, no documento intitulado “Linhas para um Programa”, distribuído com os jornais de 14 de Julho de 1974, a questão da Autonomia era abordada nos seguintes termos: “Impõe-se aproveitar todas as virtualidades que o regime autonómico encerra, num sentido autenticamente democrático. O PPDA defende, além da eleição directa das juntas gerais, a alteração da sua composição (supressão dos chamados “procuradores natos”) e do seu modo de funcionamento, que deverá aproximar-se, como aconteceu outrora, do de um parlamento local”. E mais adiante: “A consideração das questões propriamente açorianas a nível do Arquipélago virá a exigir no futuro instituições político-administrativas de base regional. O PPDA, encarando com optimismo a realidade dos novos tempos, propugna a criação de uma Assembleia Representativa do Povo dos Açores, à qual, para além de outras funções, incumbiria , por intermédio de uma Comissão por ela eleita, a coordenação da actividade exercida, a diversos níveis, por outras entidades, designadamente as juntas gerais dos distritos autónomos”.
Conjuntamente com o anteriormente citado foi distribuído um outro documento com o título “Declaração Preliminar” onde se podia ler o seguinte: “O PPDA visa estender a sua acção a todo o Arquipélago. A diversidade das ilhas e do modo de ser da sua gente impõe-se por si só como facto indesmentível e constitui uma das grandes riquezas dos Açores. Mas há problemas comuns a resolver que exigem a união de esforços de todos os açoreanos. É preciso superar as barreiras que porventura, e para prejuízo nosso, nos separam. E no respeito pelas realidades e pelas tradições arreigadas de cada comunidade insular, trabalharmos todos na construção de uma sociedade livre e em progresso. Convocando pessoas de todo o Arquipélago para a luta por objectivos comuns, o PPDA contribuirá decisivamente para a consolidação da unidade açoreana, penhor da nossa sobrevivência como Povo dotado de identidade própria.”
Dentro desta mesma ordem de considerações, o outro documento já referido afirmava: “Existem nos Açores potencialidades e aptidões cujo pleno aproveitamento permite antever a obtenção de níveis de vida sucessivamente melhores para o Povo Açoreano. O PPDA luta pelo progresso económico acelerado dos Açores e pela justa distribuição do rendimento criado entre o Povo Açoreano.”
Podia continuar com citações das tomadas de posição do Partido nos primeiros tempos da Democracia, evidenciando que então de viu longe e se puseram as bases do que viria a ser a nossa Autonomia Constitucional. Mas já pelo que se disse pode bem concluir-se que houve rasgo inicial e depois uma luta aberta para o tornar realidade, que ao contrário do que alguns dizem a Autonomia não foi uma benesse da Revolução aos Açores, mas sim o resultado dessa luta, conduzida sempre perante o Povo e mobilizando a sua força pelos processos democráticos, nomeadamente mediante eleições.
Tudo isso está comprovado em inúmeros documentos, escritos e gravados em som e em imagem, não podendo ser ignorado por quem quer que pretenda fazer a seu tempo a História dos Açores nessa era fascinante.
João Bosco Mota Amaral*
*(Por convicção pessoal, o Autor não respeita o assim chamado Acordo
Ortográfico)