Habituei-me há algumas décadas a ir ao cinema, aproveitando o pequeno valor da semanada que os meus pais me proporcionavam, dando-me a oportunidade aos domingos de ver dois filmes com um pequeno intervalo. As recordações iniciais são do então cinema Max, edifício de bairro e que permitia de modo económico adquirirmos cultura ao nível cinematográfico.
Avidamente víamos de tudo e criávamos expetativas sobre o desenrolar dos conteúdos dos filmes. O certo é que muitas das vezes os filmes não tinham interesse mas “lá aguentávamos” o desbobinar da pelicula na esperança de que algo de aceitável ou pelo menos de interessante surgisse antes do fim do filme.
Bastas vezes essas expetativas foram goradas e ficamos com a sensação de ter “enfiado um grande barrete” e desperdiçado o “sensível”, por pouco, dinheiro da semanada.
Nesses casos ficava de positivo as horas (para dois filmes) que ficávamos a tentar descobrir se o filme se “alterava” de modo a contribuir com algo positivo para as nossas vidas, porque não queríamos admitir que o(s) filme(s) era(m), por vezes, tão medíocre(s), para não dizer péssimo(s).
Porquê tudo isto? Porque me surge na memória algo com mais de seis dezenas de anos?
Simplesmente porque quando revejo o dia a dia atual – admitindo os políticos que nos rodeiam ou a sua péssima politica económica, social ou mesmo demográfica – me parece que estou a ver um daqueles filmes tão maus que continuávamos sentados e de olhos esbugalhados, mas de mente sofredora na expetativa de saber como e quando é que uma “coisa” tão má irá ter um fim.
É que quando eram filmes de terror ainda dava para comentar com o amigo do lado e esboçar uns risos, pelo ridículo das cenas e falta de qualidade.
Na atual vida diária e olhando pelo que se passa a nível politico nacional, em que incluo a parte regional nos Açores, o “filme” é mesmo péssimo e não se perspetiva qualquer melhoria no decurso do mesmo ou mesmo como acabará. Sinceramente nem consigo identificá-lo como sendo de terror ou mesmo trágico-cómico.
É uma situação em que apetece dizer “por favor, tirem-me deste filme!” em que os governantes e/ou políticos em geral manifestam tão má qualidade de desempenho que ficamos enrolados nas péssimas cenas dos “próximos desempenhos”.
É fácil identificar os protagonistas e/ou o assunto deste filme real. No entanto tudo o que se passa politicamente com estes “atores” influência a vida dos cidadãos e vai ficando diariamente cada vez pior, perspetivando-se algo péssimo no final.
Quanto a mim a solução era “exportar” estes “atores políticos”, o que me parece possível quando realizo, através da comunicação social, que alguns articulistas pedem não só a demissão de membros do governo como de alguns gestores públicos que parecem estar a mais e a situação só piorará de dia para dia. Infelizmente no âmbito da politica em geral quem “entra” tem tendência a agarrar-se ao “tacho” e pensa que está a desempenhar um bom papel.
Estamos num momento crucial para todos nós na Região. O assunto do dia mantem-se no âmbito das finanças e a sua situação é sensível para o futuro de todos os que vivem nos Açores. As dívidas no setor público regional, tendem a aumentar todos os meses sendo que atingirão um valor demasiado elevado para os nossos recursos.
A grande esperança dos governantes regionais, porque não conseguem descortinar outras soluções válidas, está na negociação da lei das finanças regionais – LFR, falando-se em centenas de milhões que pretendem que fique estabelecido como obrigação da República, a denominada solidariedade nacional, atualizada anualmente e suportando aquilo que os responsáveis da Região gastam de modo “descontrolado” como admitiu o secretário regional das finanças.
Para dar um ar sério, de quem quer ser responsável, o secretário das finanças sugere um “plano” para 2026 e assim poupar 20 milhões de euros, entre outras coisas por exemplo com viagens, estudos e auditorias, organização de congressos/conferências e quiçá almoços e jantares.
A mensagem é para a República: vejam como estamos a trabalhar na poupança, “tornamo-nos políticos adultos e responsáveis”, merecendo a vossa maior compreensão para uma “boa” LFR a favor da Região (nesta altura o desempenho do ator é de “pobrezito”, sem recursos próprios, mas gastando em tudo o que lhe apetece).
Já agora uma pergunta de leigo, que sou: quanto custará o estudo, feito exteriormente à Região, da nova LFR? Espero que os 20 milhões, a poupar em 2026, sejam suficientes para pagar e não fiquemos com mais uma dívida da Região.
Para além de querer vender a Sata pelo preço da “chuva”, como se usa dizer em português, o governo regional decide assumir o total das dividas da empresa e quer arrecadar dinheiro pela venda de outras “joias da coroa entregues à responsabilidade de Bolieiro”, como seja o caso da SATA Holding (processo atrasadíssimo e que segundo a Comunidade Europeia tem de estar finalizado a 31 de dezembro, sob pena de termos de devolver verbas), do IROA, SEGMA, Globaleda, Teatro Micaelense e Portos dos Açores.
Com todo este “dinheirame” de certo o governo vai pagar aos fornecedores a quem deve há imenso tempo, irá entregar os subsídio a quem concorreu a múltiplos programas de apoio regional e está sem receber os mesmos há meses ou vai apoiar a enorme quantidade de açorianos que no seu dia a dia lutam para ter comida para si e os filhos ou adquirir medicamentos e enfim ter uma vida que lhes seja minimamente favorável e que merecem.
Mas a privatização da Azores Airlines ainda vai dar muito que falar e em pouco tempo.
O consórcio que quer adquirir a companhia, após ter a garantia do governo regional de que o fará sem as dívidas acumuladas de cerca de 400 milhões de euros, quer negociar com o sindicato dos pilotos uma redução de 10% na sua massa salarial anual. Em 2024 a massa salarial – vencimentos mais adicionais e encargos – foi de pelo menos 31 milhões de euros.
Claro que os sindicatos declararam não aceitar esta redução. No entanto, demonstrando querer mostrar a sua força, o consórcio faz depender a decisão de compra da Azores Airlines de chegar a acordo com o sindicato sobre esta redução salarial. Parece chantagem!
A perspetiva, na minha opinião, é que não haverá privatização, até porque de certo irão surgir outras imposições por parte do consórcio após a aquisição, com consequências no desempenho normal da companhia, mantendo os diversos sindicatos que existem na Sata a capacidade de exigir/recusar, pela sua parte, e não admitindo pressões que me parece ser e virem a ser feitas pelos novos donos da empresa.
Caso falhe a privatização o secretário regional das finanças já afirmou publicamente e por várias vezes, que irá proceder a “negociações particulares” (seja isto o que for; atrevo-me a dizer que nem ele sabe o que é!?) e em caso de não ter sucesso com este processo, vai nos prevenindo que poderá ocorrer uma falência.
Parece que o futuro da Região não é muito risonho. Estamos numa enorme expetativa e tal como nos filmes de “quinta categoria de antigamente”, a que nos referimos inicialmente, vamos obrigatoriamente esperar pelo fim do mesmo, antevendo que será preocupante.
Talvez fosse oportuno acabar com esta exibição pública cinematográfica, sem qualquer oportunidade deste filme governativo chegar rapidamente ao fim, admitindo que os secretários das finanças e transportes em conjunto com o conselho de administração da Sata, deveriam ser retirados do elenco. Claro, que o mais rápido possível!
J. Rosa Nunes
Prof. Doutor