Não haja vendas nem escolhos
Nem um inflamado ego
O vendedor pode ser cego
O comprador … terá mil olhos!
A compra e venda tanto pode realizar-se no estabelecimento comercial, como fora dele e ainda à distância (correio, correio electrónico, telefone ou telecópia).
Contrato de compra e venda de consumo é “qualquer contrato ao abrigo do qual o fornecedor … transfere a propriedade [da coisa] para o consumidor, [podendo ter] simultaneamente por objecto bens e serviços.”
É o caso dos bens com conteúdos ou serviços digitais… como um telemóvel inteligente que pode vir com uma aplicação normalizada pré-instalada fornecida nos termos do contrato de compra e venda, como por exemplo uma aplicação de câmara ou um sistema de alarme. Ou um relógio inteligente com elementos digitais, que só podem desempenhar as suas funções com uma aplicação fornecida nos termos do contrato, mas que deverá ser descarregada em um telemóvel inteligente.
«Contratos fora do estabelecimento comercial»: os celebrados na presença física simultânea do fornecedor e do consumidor em local que não seja o do estabelecimento, inclusive nos casos em que a proposta contratual parte do consumidor e em que os há até celebrados no próprio estabelecimento, como sucede após ser o consumidor contactado, pessoal e expressamente, em local que não seja o do próprio estabelecimento.
Que outras modalidades revestem tais contratos?
Os celebrados:
No local indicado pelo fornecedor…, a que o consumidor se desloque, por sua conta e risco, na sequência de uma comunicação comercial do fornecedor, como os celebrados em instalações, de bombeiros, por exemplo, para venda de produtos de saúde, precedidos, tantas vezes, de falsos rastreios;
No domicílio do consumidor (porta-a-porta);
No local de trabalho do consumidor (no trabalho);
Em reuniões em que a oferta de bens é promovida por demonstração perante pessoas reunidas no domicílio de uma delas, a instâncias do fornecedor (reuniões Bimby);
Durante uma deslocação organizada pelo fornecedor fora do respectivo estabelecimento comercial (ao estilo do “conheça a Galiza grátis”).
Tais contratos, ao contrário dos correntes contratos de compra e venda, têm de ser de papel passado, sob pena de nulidade: se o não forem, são nulos e de nenhum efeito.
Mesmo depois de celebrados, dispõe o consumidor, no geral, de 14 dias para se retractar, para dar o dito por não dito. Contanto que tal cláusula – a do direito de retractação – conste do contrato. Com excepção dos contratos ao domicílio e os celebrados no decurso de excursões adrede organizadas pelos fornecedores, em que o prazo para o direito de retractação é agora de 30 dias.
Se, porém, tal cláusula não constar, o prazo alarga-se: em vez dos 14 ou 30 dias, consoante os casos, disporá de mais 12 meses. Doze meses a acrescer aos 14 ou 30 dias, de acordo com a concreta modalidade perfilhada.
Para o exercício do direito de dar o dito por não dito não tem de se invocar causa ou motivo, não implica indemnização a cargo do consumidor nem é susceptível de renúncia.
O consumidor pode dar o dito por não dito por qualquer meio, carta, correio electrónico, telefonema, desde que fique com prova bastante de que o fez.
Em geral, os contratos trazem um formulário que, uma vez preenchido e expedido, constitui elemento bastante para o efeito.
Há, porém, excepções ao direito de “dar o dito por não dito”. Salvo acordo em contrário, o consumidor não pode retractar-se, entre outros, no caso de bens: confeccionados de acordo com especificações do consumidor ou manifestamente personalizados; selados, insusceptíveis de devolução por motivos de protecção da saúde ou de higiene quando abertos pós-entrega; gravações áudio ou vídeo ou programas informáticos selados, a que se haja retirado o selo de garantia de inviolabilidade pós-entrega…
Se o consumidor puser termo ao contrato, no uso do seu direito de retractação, o fornecedor terá de restituir o montante pago nos 14 dias seguintes.
Se o não fizer, procederá à restituição em dobro do preço pago, sem prejuízo da indemnização por danos materiais e morais a que houver lugar.
Saber dos seus direitos é algo de essencial.
Não há pior mal que a ignorância!
Mário Frota*
*Presidente emérito da apDC – DIREITO DO
CONSUMO – Portugal