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Direitos & Deveres

Direitos & Deveres é a nova rubrica semanal resultante de uma parceria entre o jornal Diário dos Açores e a sociedade de advogados José Rodrigues & Associados. Neste espaço, iremos procurar esclarecer dúvidas jurídicas colocadas pelos nossos leitores bem como abordar alguns dos temas mais comuns que entretecem a comunidade jurídica. Se tiver algum tema que queira ver abordado ou alguma questão que queira ver esclarecida, não hesite em enviar-nos um mail para [email protected].

Atenção às facturas da luz e da água

Não é caso raro as empresas de fornecimento de serviços essenciais procederem a ajustes dos valores a pagar pelos consumidores com base nas diferenças existentes entre as leituras efetivas e os valores cobrados com base em estimativas. Sucede, porém, que, por vezes, as empresas extravasam o direito de cobrança, exigindo do consumidor o pagamento de valores acumulados, os quais, para além de excessivos, podem constituir uma cobrança abusiva por ser realizada muito fora do tempo permitido para o efeito.
Vamos a um caso particular. Recentemente, um consumidor foi confrontado com uma factura da empresa de electricidade (EDA) em que lhe era exigido que pagasse valores acumulados desde 2023. Note-se que todos os meses este consumidor recebia uma factura da empresa a qual pagava tempestivamente. Alegava a empresa que os valores em causa eram “acertos” com base na leitura efetiva dos consumos que, no caso em apreço, superavam o valor de estimativa cobrado todos os meses pela companhia.

O que diz a lei?
A Lei dos Serviços Públicos (Lei nº 23/96 de 26 de julho) define, no seu artigo n.º1 os serviços públicos essenciais abrangidos, quer sejam prestados por entidades públicas ou privadas a clientes particulares, ou empresas. São eles:
fornecimento de água;
recolha e tratamento de águas residuais;
fornecimento de energia elétrica;
fornecimento de gás natural e gases de petróleo liquefeitos canalizados;
comunicações eletrónicas;
serviços postais;
gestão de resíduos sólidos urbanos.
transporte de passageiros.
A mesma lei estabelece, no artigo 10.º a prescrição do direito ao recebimento: “o direito ao recebimento do preço do serviço prestado prescreve no prazo de seis meses após a sua prestação”.
Isto significa que ainda que o fornecedor tenha o direito de receber o serviço que prestou, o pagamento não é obrigatório uma vez que as dívidas relativas a consumos realizados prescrevem ao final de seis meses.
Apesar disso, convém ter presente que, na esmagadora maioria das vezes, o fornecedor vai tentar cobrar o valor, muitas vezes incluindo os valores anteriores com outros mais recentes e o consumidor mais distraído acaba por pagar ou estabelecer um plano de pagamento para regularizar a situação.
Nestas situações de consumos antigos, o ónus da reclamação compete ao consumidor, uma vez que se pagar a dívida, mesmo prescrita, estará a reconhecer a sua existência e perderá o direito de invocar a sua prescrição.
Por esse motivo, sempre que receber facturas relativas a serviços públicos essenciais atente na data de referência dos consumos. Se verificar que existem consumos com mais de 6 meses, ainda que resultantes de acertos, tenha consciência que não tem de os pagar. Para o efeito, terá que invocar a prescrição dos valores cobrados dos consumos realizados há mais de 6 meses, proceder à respetiva reclamação no portal https://www.livroreclamacoes.pt/ e solicitar a anulação dos valores exigidos.
Muitos consumidores quando confrontados com valores de acertos, por vezes muito elevados quando comparados com o seu consumo normal, optam por pagar a factura até porque temem que a prestação do serviço seja cancelada. Lembre-se que não o deve fazer. A lei protege o consumidor de cobranças excessivas e indevidas, ainda que se reporte a situações de acertos por via de valores cobrados por estimativa.
Já agora, convém também saber que tem direito a reembolso na situação em que os valores cobrados por estimativa sejam superiores aos consumos efetivos. Também aqui a lei é muito clara: se o prestador de serviço cobrou em excesso, tem de o reembolsar o cliente do valor cobrado em excesso em relação ao consumo efetivamente ocorrido.

PS: no caso que referimos no início da nossa rubrica, o consumidor, devidamente aconselhado, reclamou e como resultado não teve que pagar a factura avultada com os valores prescritos, tendo a empresa corrigido a factura e subtraído à mesma os valores dos consumos realizados há mais de 6 meses.

Beatriz Rodrigues

Nota: para mais esclarecimentos consulte a Lei nº 23/96 de 26 de julho e, se necessitar de ajuda, consulte uma advogada.

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