O “Chanceler de Ferro”, célebre estadista prussiano do século XIX, Otto von Bismarck, não inscreveu a sua célebre frase no direito autoral, mas permitiu que qualquer um a soubesse citar e, pior, deturpando o seu verdadeiro sentido. A citação original reza mais ou menos assim: “Die Politik ist die Kunst des Möglichen.”, isto é, “A política é a arte do possível”. A frase encerra uma visão pragmática da política: realizar o possível dentro dos limites da realidade, das circunstâncias e da correlação das forças. Ou, dito por outras palavras, faz-se a omelete com a quantidade de ovos disponíveis.
Contudo, esta visão política realista, levada ao extremo das consequências, afasta de todo a possibilidade do sonho e da esperança. Por ela, toda a política seria, em última análise, um triste campo de interesses e de forças em confronto, potencialmente bélicas, que decidem o destino e a vida das populações em direção ao futuro. O valor do indivíduo, a sua liberdade, e a sua vontade, deixaria de ser o centro gravitacional do Estado, âncora e porto de abrigo da sociedade. E, por último, a função do Estado passaria a ser a defesa dos grandes desígnios nacionalistas e patriotas – vulgo interesses de uma ínfima minoria política e económica.
Por essa via, e por via da falência de toda uma anarquia reinante e corrupta dos inícios do século XX, surgiram circunstanciadamente regimes totalitários e fascistas por toda a Europa: Hitler, Mussolini, Franco, Salazar. Lembra-nos a História remota, mas também a recente.
E, pergunta-se: tendo a esquerda portuguesa nos últimos dez anos levado a legalidade de alguns temas ao extremo, nomeadamente as leis da imigração, ou exponenciando a irresponsabilidade política ao obrigar os portugueses a pagar impostos até mais não, criando uma máquina institucional do Estado obesa, burocrática e confusa, não estaríamos nós a abrir a porta ao surgimento de novas formas de fascismo?
A memória não se pode apagar, e não podemos repetir os erros e os comportamentos que levaram aos totalitarismos emergentes do século XX. Há novos mitos no ar, são precisas também novas responsabilidades.
Luís Soares Almeida