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Amigos, amigos, autonomias à parte

“Para as pessoas mais distraídas, o que se passa remete-nos para uma realidade que beira o abismo. Estamos perante uma falta crónica e sucessiva de resposta adequada às necessidades de abastecimento das empresas locais.”

Terça-feira, dois de setembro de dois mil e vinte e cinco. Paulo Simões, deputado eleito pelo PSD e Presidente da Comissão de Economia, toma a palavra, em reunião, para ler uma missiva vinda de Lisboa. Por momentos, somos transportados/as para o tempo dos Descobrimentos, quando chegavam cartas dos monarcas da Metrópole para anunciar novidades às pessoas da província insular, lá longe no meio domar.
Simões lê o comunicado de Miguel Pinto Luz, outro do longo leque de ministros que Luís Montenegro parece ter escolhido propositadamente como exemplos do que não fazer, nem ser, quando se brada pela meritocracia. O senhor Ministro das Infraestruturas fez saber, por interposta pessoa, que não se faria ouvirem Comissão, para qual havia sido convidado pelo povo açoriano, através das suas e dos seus deputados. Fez saber que não o faz, porque não quer ferir o princípio da imparcialidade política. Afinal de contas, onde é que já se viu um Ministro a ser político? E parcial? Só nos desenhos animados, certamente.
Miguel Pinto Luz anunciou que não vai responder às questões preparadas pela Comissão, referentes a assuntos relacionados com a avaliação do atual modelo de transportes marítimos e abastecimentos locais.
Para as pessoas mais distraídas, o que se passa remete-nos para uma realidade que beira o abismo. Estamos perante uma falta crónica e sucessiva de resposta adequada às necessidades de abastecimento das empresas locais. Nem mesmo o centralismo escapa, porque é também em São Miguel que a coisa se tem sentido com particular ardor. A responsabilidade é, evidentemente, uma questão a abordar com o Terreiro do Paço, porque é de lá que deveriam emanar as diretrizes e estratégias necessárias para manter a sacrossanta coesão territorial. Mas, isso só serve quando lhes interessa, claro está. O senhor Ministro escudou-se e apelou à compreensão e ao respeito pela separação de poderes e governos.
Num ápice, Miguel Pinto Luz transformou-se num acérrimo defensor da importância da Autonomia! Será o governo de Montenegro tão transformista quanto o de Bolieiro?
Importa recordar que Miguel Pinto da Luz só engana quem se deixa enganar. Já se esqueceram da sua breve passagem, pelos Açores, enquanto candidato à liderança do PSD, em 2019, onde mostrou uma profunda preocupação com a Universidade dos Açores e com o défice de financiamento da instituição, acusando o, então, Governo da República de “não querer dar resposta a este problema tão gritante”, acrescentando que “Uma universidade com estas características, tripolar, numa região ultraperiférica, tem desafios que nós temos de olhar e tratar de forma diferente. Não podemos tratar igual aquilo que é diferente e por isso temos de ter abordagens diferentes.”. O seu partido é Governo e o que fez pela Universidade dos Açores? Adoptou um modelo de financiamento que prejudica aquela que era uma instituição com a qual tinha tanta preocupação…
Voltando à atualidade, certo é que, quando lhe deu jeito o mesmo Ministro não se lembrou da imparcialidade, nem coisa parecida, e, em sede da mesma Comissão, foi ouvido acerca do Subsídio Social de Mobilidade – após ter introduzido um teto de 600 euros de custo elegível máximo, sendo que as pessoas passaram a suportar o valor acima desse teto (além dos 134 euros) – presenteando a província comum as declarações plenas de colonialismo encapotado. A separação de poderes, à época, devia estar de férias.
Recordem-se que Miguel Pinto Luz é do mesmo partido que Paulo Simões representa e que José Manuel Boliero lidera, nos Açores. Recordem-se, também, que vivemos tempos de plenitude alaranjada, com todos os órgãos de soberania democrática a serem comandados pelo mesmo partido, sendo que em alguns casos está auxiliado por outros menores. Portugal é totalmente governado pelo PSD e, no entanto, o PSD não se entende consigo mesmo.
Assim vai a história das finanças regionais e da conferência de líderes que Montenegro quer muito, muito, muito fazer, com Bolieiro e Albuquerque. O Luís, lá em Lisboa, quando não está ocupado a esconder imóveis da Entidade para a Transparência, passa uma parte dos seus dias a arranjar maneira de não falar com os senhores das ilhas. Será, talvez, um amante da história de Portugal, que deseja voltar ao tempo em que o monarca falava em Lisboa e as orelhas baixavam nos Açores. Mesmo que, para o efeito, seja preciso abandonar os colegas cor-de-laranja.
Esses desentendimentos e centralismos arrogantes persistem também noutros casos.
Vejam-se as declarações da presidente da Praia da Vitória, que acordou do adormecimento veraneante para se lembrar que tinha campanha eleitoral para fazer este ano. Vânia Ferreira questionou a administração da RTP, ao saber que a mesma tinha decidido deixar a delegação da RTP/Açores, na ilha Terceira, sem qualquer tipo de segurança, e de portas fechadas ao público.
Há algum tempo que assistimos a um processo de destruição dos nossos canais de comunicação social públicos. Montenegro, e os amiguinhos neoliberais, retomaram os esforços do padrinho Passos, para acabar com o projeto até ao final do mandato. E esse trabalho de desossar o esqueleto da Rádio e Televisão de Portugal vai ter consequências, desde logo para nós, aqui tão longe.
Fartaram-se os senhores das gravatas de fazer propaganda e publicidade, engrandecendo a RTP/Açores por ter 50 anos de existência, em 2025. Vídeos e mensagens institucionais que vieram do país inteiro. O que não veio foi uma visão para salvar o barco e tapar os buracos. Em vez disso, vieram mais cortes. Até ao corte final, que chegará um dia.
O que Vânia e Paulo não nos disseram, mas deviam ter dito, é que as atitudes de Luís Montenegro, Miguel Pinto Luz ou da administração da RTP também são culpa sua. O PSD está a parasitar os Açores e a promover e consolidar o colonialismo e o centralismo que sempre afetou as nossas ilhas. E se o PSD não quer saber dos seus, quanto mais quererá dos pobres coitados que se dignarem a falar contra eles.
Este é o futuro da Região. Um conjunto de nove ilhas onde autonomia é palavrão, e subserviência é recompensada com desprezo. Para o ano há festa para celebrar um aniversário redondo. Alguém que se lembre de falar disto, antes que seja a última efeméride a celebrar.

Alexandra Manes

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