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Saúde Pública e a Saúde do público, semana a semana (36):

O regresso da Gripe A e das eleições, num ano que se quer “mais asseado”

A Ciência da Semana: aumentar a cobertura da vacina anti-VSR

Cerca de 300 crianças já foram internadas em Portugal continental devido ao vírus sincicial respiratório (VSR), no último trimestre; só entre 2 de outubro e 10 de dezembro, o VSR obrigou ao internamento de 145 crianças até aos 2 anos (dados do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge, INSA), sendo que 47% tinha menos de 3 meses de idade; 3% tiveram necessidade de ventilação, ou foram internados em Unidade de Cuidados Intensivos.
Na época 2023/2024 (que teve início na semana de 2 a 8 de outubro) os laboratórios da “Rede Portuguesa de Laboratórios para o Diagnóstico da Gripe e Outros Vírus Respiratórios” notificaram 23.441 casos de infeção respiratória e 1.569 casos de gripe na população, até 9 de Dezembro. Só na semana de 4 a 9 de dezembro foram identificados 437 casos positivos para o vírus da gripe, dos quais 369 do tipo A. Desde 2 de outubro, foram detectados 38 casos de coinfecção pelo vírus da gripe e covid-19.
É crucial que se fomente em todo o país uma elevada cobertura da vacina anti-VSR, à semelhança do que acontece na Madeira, com resultados evidentes, e que a cobertura vacinal para a Gripe e COVID-19 aumente. Para evitar que estas doenças provoquem surtos, danosos até em vidas humanas.

Os dados para análise: cortes na indústria farmacêutica que podem pôr em causa a investigação de vacinas e tratamentos para o cancro

O WSJ mostrou há dias um retrato inesperado da indústria farmacêutica, em queda rápida, devido a uma combinação de erros e a uma leitura errada do comportamento do público. A Pfizer sobrestimou a procura futura de “produtos pandémicos”. Mas, não esteve sozinha nas vendas decepcionantes “para a Covid-19”. A Moderna também sofreu uma queda acentuada. A actual sorte da Pfizer contrasta com a empresa na pandemia, quando investigadores e trabalhadores se mobilizaram para entregar a primeira vacina contra a Covid-19, do mundo. Embora a vacina tenha sido desenvolvida com o parceiro alemão BioNTech, o mundo refere-se à vacina pelo nome Pfizer. A vacina permitiu a reabertura de economias e o regresso das crianças à escola. Em 2021 e 2022 a vacina ultrapassou 36 mil milhões de dólares de vendas anuais, mais do que qualquer medicamento sujeito a receita médica alguma vez teve num único ano. Mas, avaliaram mal a procura depois do público deixar de “temer” a Covid-19. A Moderna, que facturou 18,4 mil milhões de dólares em vendas da sua vacina contra a Covid-19 em 2022, espera menos de 6 mil milhões de dólares este ano… resultado de tudo isto, mais de 2000 trabalhadores em todo o mundo (de um total de 83000 da Pfizer) perderam os seus empregos. Saíram trabalhadores industriais no Michigan e na Irlanda, cientistas da área oncológica na Califórnia e investigadores em Groton (Connecticut), Pearl River (Nova York), e Sandwich (Inglaterra). A empresa suspendeu o financiamento a programas de pesquisa de vacinas, como o de uma vacina Covid-19 de 2a geração e de uma vacina contra o “C. difficile”, de acordo com o “The Wall Street Journal”. Na Pfizer, muitos outros trabalhadores temem ser os próximos. Uma tática dos funcionários para antecipar as demissões é monitorizar as agendas dos gestores. Esperam-se mais demissões se as agendas encherem com reuniões de 15 minutos, o tempo que os supervisores demoram a partilhar “más notícias”. Perder força de trabalho altamente treinada na investigação de novos produtos que neste momento “não são rentáveis”, pode ter consequências inesperadas na descoberta de vacinas e medicamentos que salvariam milhares de vidas. Há que estar atento.

A homenagem da semana: ao eleitor português, para que em 2024 saiba escolher quem tem visão Estratégica, e sabe gerir de forma decente o Erário Público

Há uns bons anos atrás, uma saudosa professora minha disse numa aula: “o aluno baldas só quer ter o “10”, o bom aluno quer aprender e ter uma boa nota”. Acredito que na vida profissional acontece o mesmo: a retribuição monetária é uma parte relevante num emprego, mas não a única. Há muitas outras variáveis que, se não ajudam a se ser feliz no trabalho, pelo menos o tornam menos penoso.
Vem isto a propósito do “Relatório sobre o estilo de vida e felicidade dos médicos”, de 2023, do Medscape: “alegria no meio do stress”. O mesmo mostra que os médicos perceberam que o seu nível de felicidade, e o equilíbrio entre a vida pessoal e profissional, não estão a recuperar, à medida que os efeitos da COVID-19 no local de trabalho diminuem. Este ano, a mesma proporção de médicos do Relatório de 2022 (81%) disse ser “muito” ou “um pouco” feliz fora do trabalho, antes da COVID-19. Também a mesma percentagem do relatório do ano passado (59%) disse que está “muito” ou “um pouco” feliz hoje.
Quanto à forma como se sentem durante o dia de trabalho, a COVID-19 desferiu um golpe na felicidade dos médicos, da qual claramente ainda não recuperaram. Uma razão pode ser o facto de não conseguirem trabalhar remotamente, como se faz noutros sectores. Estudos em várias indústrias mostraram que o equilíbrio entre vida pessoal e profissional melhorou, durante e após a pandemia, devido ao aumento do trabalho remoto.
Nas médicas uma percentagem substancial lida com sentimentos de conflito fortes, ao equilibrar as responsabilidades parentais com um trabalho altamente exigente. Para aumentar este stress, as médicas têm muita dificuldade em falar sobre este conflito com os seus (e as suas) chefes, e recusam oportunidades de progressão na carreira, segundo um artigo do JAMA. Na realidade portuguesa isto é particularmente relevante, quando constatamos que mais de 70% dos jovens médicos são mulheres…
No relatório do ano passado, 55% dos médicos disseram que “ganhar menos para aproveitar mais a vida” lhes parecia bem. O “National Bureau of Economic Research” confirma que 40% dos trabalhadores americanos aceitaria um corte salarial, com esse fim. Talvez as exigências da medicina tornem esta troca mais atraente, ou talvez seja uma decisão mais fácil, dados os seus rendimentos.
Agora que o pior da pandemia já passou, é preciso perceber o que move os profissionais, no seu dia-a-dia. Tentar aplicar a mesma receita a realidades totalmente distintas só pode dar asneira. Se por um lado não se pode permitir o parasitismo de algum sector privado, em relação ao público (mais sujeito a esta acusação quando os responsáveis clínicos no privado são-no também no público – e até com responsabilidade públicas associadas, o que torna tudo isto um caldo de conflito de interesses nauseabundo), por outro não pode a Legislação continuar a ser estanque a novas modalidades de exercício laboral, em particular aos que procuram tempo para a conciliação familiar, e a fruição de uma vida mais satisfatória.
Não deixa de ser curioso constatar o peso que alguma opinião pública (pequena, mas muito ruidosa e manobradora) tem na “falsificação da Historia. Se por lado quando o bullying laboral é evidente (com provas por todos os lados – como o assédio de “responsáveis” a trabalhadores em estado de doença, usando de forma insistente o telemóvel pessoal e o e-mail destes, para pressionar quem tenta recuperar a sua saúde, altamente danificada no exercício do seu trabalho!) uma “esponja” é passada, em nome de uma “Paz social” que custa muito dinheiro aos contribuintes: de forma directa, nos ordenados pagos principescamente a múltiplos erros de casting, e de forma indirecta pelos danos causados na Coisa Pública, com efeitos a longo prazo. Veja-se nos Açores o estado em que ficaram empresas de todos nós, como a SATA, depois de algumas administrações lá terem passado… E das consequências das suas decisões, em resultados.
Os interesses, à volta dos poderes políticos, neste Portugal da III República, pouco ou nada têm mudado, mesmo quando muda no Poder o partido político, eleito pelo povo. E, talvez por isto, não se tenha aprendido com os erros que se foram cometendo, ao longo dos últimos 50 anos, repetindo esses erros até à exaustão do bolso do contribuinte português, passando-se depois ao bolso do contribuinte alemão, e dos povos do norte da Europa. Até estes se fartarem.
É o que é, e seria bom, excelente, que em 2024, quando precisamente se comemora – com toda a pompa – os 50 anos da implantação deste regime, isto tudo, Portugal, passasse a ser “algo mais asseado”, citando um dos nossos maiores. É o meu desejo para 2024, com votos de muita saúde para todos.

Mário Freitas*

*Médico consultor (graduado) em Saúde Pública, competência médica de Gestão de Unidades de Saúde

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