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Flores Turismo 2013 Parte 5 (II)

Apesar das muitas estradas e caminhos municipais razoavelmente asfaltados, para tão pouca gente, pela omnipresente Tecnovia, apesar de algumas construções modernas como o futuro centro Cultural das Lajes (em fase de acabamento), parece faltar massa crítica capaz de promover um maior desenvolvimento económico que liberte esta ilha da estagnação e da sangria que a constante saída dos mais jovens impõe. É imperioso criar condições para que não sejam obrigados a partir, a emigrar para outras ilhas maiores e com maiores oportunidades. É preciso reinventar formas de os fixar aqui sem ser apenas nos meses mais buliçosos de verão e turismo (junho a setembro). A continuar assim e à medida que a população envelhece sem que os jovens aqui se fixem, arriscamo-nos a assistir ao lento despovoamento e à inviabilidade económica destas ilhas mais pequenas, tanto mais que o governo central (e agora também o Governo Regional) insiste em fechar serviços e valências desde correios a tribunais, finanças e centros de saúde.
Por outro lado, esta ilha e a do Corvo são sempre as sacrificadas quando há avarias de barcos no verão, e no inverno são as dificuldades próprias destes mares que os obrigam a ficarem, por vezes semanas, sem receberem mantimentos e ligações ao exterior. Custa-me imaginar que todos os esforços e abnegação deste esforçado povo ao longo de cinco séculos se venha a perder e se possa caminhar para o fim da civilização florentina açoriana. É uma pena imaginar que um dia – num futuro não tão distante como parece – estas ilhas sejam como as casas da Aldeia da Cuada, à espera de uns alemães, holandeses, portugueses ou outros que venham cá para as comprarem e tornarem rentáveis. Não tenho poder, nem financiamento, nem outros – nem mesmo ideias – capazes de alterarem este rumo, mas as ilhas menores do arquipélago rumam lentamente para a sua eventual extinção. É uma pena que locais paradisíacos como estes que tantos escritores de valor produziram não possam gerar uma espécie humana que os viabilize economicamente sem se tornarem em cidades-casino como Macau ou cidades perfeitas como Singapura e Hong Kong, mas sem alma.Serei eu o último moicano ou o último abencerragem da geração romântica? Espero bem que não e que estas duas ilhas do grupo ocidental possam progredir e viver numa economia plena, responsável e sustentável, bem como as restantes ilhas do arquipélago. Enquanto me preocupo com o futuro das ilhas, de casa em São Miguel dizem que cadela Leoa está bem, e vem a notícia prevalecente do dia, da semana, do mês, do ano, a da ida ontem à noite do cantor popularucho, o celebrado e afamado cantante pimba Quim Barreiros, à Lomba da Maia, provocando engarrafamentos e uma avalanche de gente como nem os idosos conseguem recordar. Jamais no passado se registou um evento desta magnitude. Isto ilustrao povo que temos, as diferentes noções de cultura.
Quem me ler pode bem chamar-me elitista, pois desde o Coliseu de Roma que o povo sempre preferiu este tipo de “cultura”. Não sei quem patrocinou a vinda do “cantante”1 que deve ter custado uns bons milhares de Euros, mas em véspera de eleições pode ser voto certo. Um investimento de excelente retorno, dirão os profissionais da política. Infelizmente, neste mundo Quim Barreiros, Tony Carreira e outros mexem apenas com a pequena economia – a dos pobres – sem trazerem valor acrescentado à macroeconomia local ou regional. Se bem que o valor da sua atração se possa medir em votos, nada irá acrescentar para o futuro e sobrevivência das ilhas e dos enormes desafios da pobreza, do desemprego, do alcoolismo, droga e criminalidade crescentes que, lentamente, vão corroendo o tecido social que manteve o arquipélago imutável ao longo dos séculos.
Infelizmente, estes “circos” populares ou popularuchos servem apenas para opiar ainda mais o povo iletrado, inculto e ignorante que continua a votar naqueles que melhor o exploram.
Um novo tipo de feudalismo e de escravatura que visa perpetuar o fosso entre os que “têm” e os que não conseguem a alforria. A massificação da cultura “dita popular” versus a redução abrupta dos orçamentos culturais (das artes em geral, ao teatro, à literatura, etc.) quer perpetuar o mínimo denominador comum de iliteracia. Um povo iletrado não pode ser livre nem preserva a sua autonomia, antes permanece subjugado e submisso a todos os que o espezinham.Eu aqui, na Ilha das Flores, preocupado com o futuro que ameaça tornar-se uma repetição do passado: os senhores nos seus castelos e os servos da gleba esmifrando as migalhas que lhes atiram das ameias, eternamente gratos, de chapéu na mão a agradecer tanta benesse e caridade. Claro que assim, nem o país, nem as ilhas progredirão, pois, a manutenção do “status quo” preserva a ordem estabelecida, e pessoas como eu nem chegam a ser convidadas para bobos da Corte.A crítica mordaz da alienação não agrada àqueles que são objeto da sátira e da jocosidade de quem vê o mundo numa moldura maior do que as mentes tacanhas dos que detêm o poder. Até nisto a História se repete e poucos foram os que do olvido e da lei da morte se libertaram, numa paráfrase livre desse épico que foi Camões. Resta-me lavrar aqui o meu desacordo e continuar a sonhar com a utopia (por isso, nunca conseguida) de um mundo melhor, mais justo, mais equitativo que é exatamente o oposto daquilo a que vimos assistindo nestas últimas décadas.
Possa eu continuar a contar livremente esses sonhos, essas utopias, sinal de que os senhores do mundo ainda não calaram todas as vozes. Aqui não é o Haiti (como dizia o Caetano Veloso) nem a Coreia do Norte e ainda vou tendo liberdade de pensar e de me exprimir. O meu voto continua sem estar à venda mesmo que o seu valor seja meramente estatístico e não garanta nenhuma representatividade eleitoral. Controlado, vigiado, escutado, analisado e dissecado vou resistir enquanto puder (i.e., enquanto viver) a ser um mero píxel nos ecrãs dos controladores globais que nos programam a seu bel-prazer e não será pelo medo que estragarão os momentos livres e felizes que passei aqui no grupo ocidental dos Açores.

1 Vim posteriormente a saber que tinha sido a atual junta de freguesia liderada ainda pelo meu senhorio, em fim de mandato, e que foram despendidos 17 mil euros…nem comento… e mesmo assim o candidato a presidente da junta iria perder as eleições por dois votos!

Chrys Chrystello*

*Jornalista, Membro Honorário Vitalício nº 297713

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