Esta semana assistimos a alguns episódios políticos que só elevam a dignidade dos seus protagonistas, coisa rara na política portuguesa e açoriana.
A despedida de Vasco Cordeiro da presidência do Comité das Regiões foi um momento de orgulho português e açoriano, com a presença dos Presidentes da Assembleia e Governo dos Açores, num momento de grande dignidade política, ignorado pela comunicação social lisboeta, que prefere continuar a devorar o caso das malas do deputado açoriano.
Haja alguém que dê dignidade à política açoriana, que bem precisa, pelo que a presença de adversários políticos na cerimónia de Vasco Cordeiro só dignifica a política, os seus protagonistas e a nossa Região.
Vasco Cordeiro fez um mandato exemplar, sob todos os pontos de vista, sempre na defesa das regiões europeias, especialmente as mais desfavorecidas, sem esquecer a sua luta, nesta ponta final, a favor da continuidade da política de coesão, que está sob ataque cerrado dos centralistas europeus.
Há vários anos que venho criticando o desperdício absurdo que é a nossa Região não aproveitar a experiência e os contactos ao mais alto nível dos Presidentes dos Governos Regionais, que, quando terminam os mandatos, são simplesmente abandonados pelo sistema político regional, que não prevê nenhuma figura que os resguarde e aproveite os seus conhecimentos para outras tarefas de aconselhamento e de apoio às instituições regionais.
Mota Amaral dá aulas na Universidade, Carlos César foi fazer política para o Continente, Vasco Cordeiro vai regressar à advocacia e José Manuel Bolieiro fará certamente o mesmo quando terminar o seu mandato.
Os ex-Presidentes da República ou ex-Primeiros-Ministros são chamados a conselheiros do Estado, vão para a presidência do Conselho Europeu ou da Comissão Europeia e colaboram com o Estado português em missões de aconselhamento ou de representação internacional do país em actos e cerimónias internacionais.
Nós, por cá, simplesmente dizemos adeus aos ex-Presidentes, não temos nenhuma figura estatutária que permita manter as suas colaborações e os seus conhecimentos adquiridos nos lugares de relevo que ocuparam e, se calhar, nem nos damos à dignidade de os ouvir mais.
Bons políticos, com muita experiência, conhecimento e que dão dignidade à política, não podem ser assim dispensados numa terra tão pequena como a nossa.
A política tem que ser vista com procedimentos honrosos, mas também é preciso que os políticos se dêem à honra.
É neste sentido que devemos relevar, também, a coragem do Presidente da Assembleia Regional dos Açores, ao alertar, esta semana, para as causas que afastam os cidadãos dos políticos.
Numa excelente intervenção, que passou despercebida do público, perante cerca de 60 padres em Ponta Delgada, numa Jornada de Formação do Clero, Luís Garcia falou do distanciamento das pessoas perante a política e os políticos.
“Podíamos debater as causas, mas elas são sobejamente conhecidas, e infelizmente muitos políticos contribuíram para isso”, referiu Luís Garcia, que destacou causas externas a esta situação como “uma sociedade onde nos meios de comunicação social e nas redes sociais não há espaço para o positivo”.
“Quando nos é atribuída uma missão política, social ou paroquial não é para destruirmos o que foi bem feito pelos nossos antecessores, nem tão pouco dar apenas continuidade ao que estava a ser feito, porque assim a mudança não surtirá o propósito”, insistiu o presidente do Parlamento, pedindo a todos que sejam parte deste desejo de mudança, segundo relato do Igreja Açores.
“Com inspiração, trabalho, inovação e entrosamento com as nossas comunidades, não prestamos apenas um serviço, devemos ser parte delas, das suas instituições, dos seus problemas, comungar dos seus anseios e desafios”, sublinhou Luís Garcia.
“O futuro de instituições, quer sejam de natureza temporal ou espiritual, determina que a esta dimensão mais institucional deva ser acrescentada uma mais informal e, quiçá, mais fomentadora do envolvimento das pessoas”, destacou ainda, acrescentando que “somos todos semeadores” e não coletores de frutos.
“A nossa missão é semear, sermos semeadores”, enfatizou.
Ora aí está uma mensagem com dignidade e que dignifica a política.
É preciso saber semear, explicar, comunicar, dizer a verdade, em vez dos artifícios políticos e insultos que vemos no dia-a-dia na nossa política.
Quando um governante vem dizer que não há dinheiro, porque os recursos são escassos, e as pessoas ficam escandalizadas, é porque andamos, durante décadas, a alimentar os cidadãos de que não se devem preocupar com nada, porque o Estado responde a tudo.
É uma cultura de preguiça que se instalou, criando uma sociedade dependente e subserviente, sempre à espera da ajuda do Estado.
Mudar esta mentalidade não é fácil.
Mas é preciso não desistir e continuar a semear.
Osvaldo Cabral
[email protected]