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Autonomia com dois sentidos, ou com nenhum?

Face às consequências do incêndio que deflagrou no princípio do mês no Hospital de Ponta Delgada, Paula Santos do PCP exortou, na Assembleia da República em 17 de maio, o governo central a cumprir as suas obrigações de solidariedade para com a Região. Tal como aconteceu com a passagem do furacão Lorenzo em outubro de 2019, em que o Estado, através do governo da república de então se comprometeu, e bem, com uma cobertura solidária de 85% dos prejuízos, o mesmo, como defendeu o Governo Regional, deverá acontecer (já foi, entretanto, anunciado) na sequência deste incêndio, o qual afetou também gravemente infraestruturas básicas de serviço público nos Açores.
Qualquer destes apoios solidários extraordinários constitui, sem dúvida alguma, obrigação natural do Estado e ambos em nada beliscam a existência e o exercício da Autonomia Político-Administrativa de que os Açores são, graças ao 25 de Abril, legítimos detentores e usufrutuários.
No lastro do aniversário da Região faz, no entanto, todo o sentido recordar que a Autonomia dos Açores possui um conteúdo e uma substância próprios que não se coadunam com oscilações de oportunidade e de valor, consoante a variação conjuntural das circunstâncias ou das áreas de competência própria. Assim faz pouco sentido que quase um mês antes dos graves acontecimentos no hospital de Ponta Delgada e apertado por sabe-se lá que tipo de pressões, o presidente do governo, José Manuel Bolieiro, tenha vindo à liça defender uma tese um pouco estranha e manhosa: a tese de que os sobrecustos da saúde no arquipélago, motivados pela descontinuidade e dimensão territoriais, obrigariam à comparticipação regular e direta do Estado no Serviço Regional de Saúde “porque somos um Estado de uma cidadania única” (sic).
Vamos lá ver, não há qualquer novidade em sermos um Estado e uma cidadania únicos, todos sabemos disso, mas, em simultâneo, somos um Estado que comporta duas regiões político-administrativamente autónomas por possuírem características geográficas próprias e específicas, neste caso por serem ilhas dispersas e distantes do continente, e mesmo entre si, donde decorrem importantes sobrecustos gerais com vista a assegurar o exercício igualitário da cidadania e do funcionamento da economia.
Daí as duas Regiões possuírem um estatuto, um orçamento e uma lei de finanças próprios, onde o Estado garante as transferências financeiras consideradas necessárias para o exercício autónomo das suas competências descentralizadas, como é o caso da saúde. Poderá ser discutível, como é, o atual teor da Lei de Finanças das Regiões Autónomas, mas não faz qualquer sentido, no entanto, sem que isso afete e até restrinja mesmo a própria autonomia política dos Açores, estar a exigir apoios financeiros sectoriais correntes do Estado para as áreas de competência da Região. Muito menos se em paralelo, olharmos para a justeza comparada, em sentido inverso, das atuais legítimas reivindicações açorianas sobre a partilha da gestão de uma área não regionalizada, como é a do território marítimo do arquipélago.
O que não lembra ao diabo, e constitui quase certamente uma das causas desta atual, e bem prejudicial, incoerência reivindicativa da Região junto da República, é a travagem financeira do investimento público (saúde incluída) devido à opção política de endividamento 0 do governo de Bolieiro, pese embora a folga de endividamento regional ser de momento suficientemente larga para não comprometer o futuro…

Mário Abrantes

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