Como, e muito bem, afirmaram vários analistas, o Partido Republicano (de grandes credenciais democráticas) transformou-se numa mera organização de culto de Donald John Trump. Passando a ser a caixa de ressonância de um individuo patologicamente narcisista, boçal e sem qualquer espécie de escrúpulos.
Individuo que não respeita nada nem ninguém, mesmo após ser condenado por um júri de 12 jurados, escolhidos aleatoriamente entre os cidadãos de Nova Iorque e aceites pela acusação e pela defesa. Como afirmou, em editorial, o jornal Financial Times “Doze jurados de um modesto tribunal de Manhattan enviaram uma mensagem histórica: ninguém na América, nem sequer um anterior Presidente, está acima da lei”.
Mas Trump não tardou em afirmar que tudo isso foi feito e organizado pelo presidente Biden e que se considera um preso político, em mais uma tirada de vitimização. E como isso não fosse suficientemente grave, o próprio speaker da Câmara dos Representantes, Mike Johnson, disse imediatamente que foram “os democratas” e não o júri quem condenou Trump “como parte da utilização do sistema de justiça como arma política”!
O que significa um total desprezo pelo estado de direito por parte de um ex-presidente, logo apoiado por um alto dirigente republicano que só confirma o estado de bandalheira e obnubilação, intelectual e política, em que se afunda o que resta do partido republicano. Pondo em causa repetidamente e sem qualquer fundamento objectivo, os alicerces do estado de direito do Estados Unidos, o suposto farol do ocidente livre.
Assistindo nós, que vivemos a queda de dois governos por meras suspeitas, atónitos, a tais diatribes que só cabem no âmbito das paranoias e “fakenews” organizadas pela Fox News e pelas redes sociais afectas a Trump, em total contramão das mais elementares práticas democráticas.
Bem diz, José Pacheco Pereira, que Putin e Trump são os dois homens mais perigosos do mundo. Ambos procuram um poder absoluto nos despectivos países. Segundo aquele colunista “no plano internacional, o isolacionismo dos EUA é o melhor que Trump pode oferecer a Putin”. Mais do que nunca, a posição da América no mundo é crucial, nomeadamente na Ucrânia.
Trump tem vindo a montar um verdadeiro circo, sendo ele o palhaço principal. Com a anuência cobarde de um partido que deveria estar muito mais preocupado com a defesa da democracia e da constituição do que com a defesa de um narcisista profundamente patológico, extremamente perigoso e irresponsável. O que torna a falta de coragem dos republicanos numa postura, verdadeiramente, obscena.
Resta-nos esperar que, em contrapartida, a coragem manifestada pelos jurados e pelo próprio juiz consiga fazer alguma luz em quem acredita que Trump é o messias do slogan “Make America Great Again”. Porque o “trumpismo” mais não é mais do que uma narrativa paranoica de um líder que não tem os mais elementares princípios de honestidade, educação, bom senso e apego à liberdade.
Realmente o que se passa, hoje nos Estados Unidos é uma, muito triste, palhaçada, aos olhos de todos os cidadãos devidamente informados, intelectual e espiritualmente bem formados e que prezem a liberdade e a democracia. Estamos perante uma encruzilhada terrível que poderá em causa a ordem mundial, que conhecemos, em total polvorosa.
Um país como os Estados Unidos, que tem uma massa critica vastíssima de gente de grande qualidade, cívica e intelectual, bem poderia iniciar um movimento “Cut the bullshit” (Deixa-te de tretas) como antidoto para o slogan fascistoide de Trump. Porque aqui não se trata de escolher entre republicanos ou democratas, mas de escolher entre a barbárie ou o estado de direito, a democracia e a liberdade.
Que ninguém, disso, tenha dúvidas.
António Simas Santos